quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Sobre o outro lado da mitologia

A mitologia romana esqueceu-se de narrar a expressa inveja de certos deuses e a vaidade velada de Februus, ambas despertadas na ocasião em que os humanos, à título de homenagem, designaram ao segundo mês do calendário gregoriano o nome de Fevereiro. Graças à consagração da cultura ocidental intertropical, em eras mais tarde, o período estaria associado a paixões de verão, mar, sol, festividades, preguiça, biquínis, suor, rede e brisa, fazendo todos – inclusive as divindades – esquecerem das chuvas torrenciais e das tardes que teimavam se estender pela noite.

Não se contentou com simbologia das primaveras nas zonas temperadas, e por isso Cupido reivindicou a parte que lhe cabia ao mês. “Tamanha insolência humana, vejam só. Exijo interferência, afinal em tal zona tórrida é estação de inclinação e afetos demasiadamente violentos, e eu sou o diretamente responsável por tudo isto!”. Procurou Júpiter para lhe falar, o qual não deu ouvidos por saber que Cupido era o mestre das malícias e perturbações. Frustrado, o menino alado correu para os braços da mãe Vênus.

Também se consumiu em despeito aquele responsável pela ebriedade e pelos excessos, especialmente os sexuais. “É um etrusco – exclamou Baco referindo-se à Februus, numa tentativa de persuadir uma intervenção de Júpiter – a loucura se apossou dos romanos. Vê-se por meio de tremendo paradoxo. Entregaram-se ao cristianismo, mas prestam homenagens aos deuses pagãos. Se assim o é, então que sejam ídolos mitológicos clássicos!” E diante de tanta picuinha ufanista, o deus dos deuses desejou que Baco jamais tivesse saído da barriga da sua perna.

Logo, o insatisfeito Cupido pediu ajuda ao seu grande amigo Zéfiro, o vento do oeste, para que assim espalhasse infâmias acerca do rei dos deuses, e o contrariado Baco fez murchar todas as videiras, o que causou abstinência no panteão, algo que afetou o próprio Júpiter. Cansado da cisma, convocou assembléia geral extraordinária, onde explicou os motivos para a não intromissão.

Caros, se a questão é coerência, nada mais justo que seja concedido à Februus tal homenagem

Zunzunzuns.

"Calados! Calados! – bradou Júpiter – Para os humanos, este é o período do 'adeus à carne', como vocês sabem, tal temporada também é conhecida por Carnaval. Por analogia, esta despedida pode ser considerada como a morte, bem como a purificação na quaresma. Não precisa explicitar quais os desígnios de Februus."

Tão profundo foi o silêncio, que o barulho do sorriso mudo de Februus se tornou um brado, a sua única manifestação perante toda a confusão.

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