sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Sobre vias expressas

Ninguém sabe precisar exatamente quando a primeira espécime surgiu, mas estimam que tenha sido junto com o aparecimento das cidades, que remete ao período longínquo da Antiguidade. De acordo com Clístenes de La Calle (professor adjunto da Universidade Livre de Bayeux, o qual integra uma vertente progressista de historiadores e ensina a disciplina “Arqueologia Urbana II” na instituição supracitada), as primeiras ruas passaram a existir há mais de dez mil anos.

Resgate Constantinopla ou vá à Paris, não importa, é certo que as ruas também falam suas próprias línguas e que seu léxico varia conforme o período do dia. Pela manhã são buzinas, cantadas baratas sem critério, auto-falantes, anunciadores de gás, alho, cebola, ou qualquer outro condimento que você não entende no primeiro grito do vendedor. À noite exprimem-se por meio de vidros que quebram, vozes sem donos com seus tons ébrios, miados, latidos, caminhões de lixo, gemidos, gritos, grilos.

As ruas igualmente se personificam. E segundo a vivência de seus usuários, elas poderiam metamorfosear-se em diferentes cores e contornos, travestidos em personalidade. Boas ou más.
Com fins didáticos para a sua matéria, o prof. Dr. Clístenes de La Calle em sua aula inaugural de cada semestre, solicitava sempre aos alunos que estes atribuíssem vida às ruas de sua experiência. Apesar da repetição da tarefa, o professor sempre se surpreendia com o produto dos seus estudantes. O trecho abaixo, a título de exemplo, contém parte do relato de N.F.D.A., aluna da turma de 2003.

“(...)
As de São Paulo, estranhas mulheres de constante flerte. Putas de histórias engraçadas que gostaria sempre de observar sem me envolver.
As de Curitiba, crianças quase puras, infantes quase inocentes, como sonhos e planos de uma vida futura.
As de Brasília, belas madrastas sadistas, das oportunidades perdidas, que roubam sem o mínimo pudor o doce de seus enteados.
As de Campina Grande, tão maternais como um berço. O braço e acalanto certo para qualquer tormento.
As de João Pessoa, melhores amigas a guardarem os maiores segredos de primeiras experiências, aquelas que me fizeram atingir o pleno sentido da palavra liberdade. “

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